STF, Convenção da OIT e as Demissões sem Justa Causa

*Por Luciano Coelho

Em sessão realizada na última sexta-feira (26), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu tema controverso, que é de extrema relevância para os setores produtivos, pois a decisão da Corte, em sede de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1625), poderia impactar diretamente no poder diretivo das empresas, especificamente no tocante a possibilidade de demissões de empregados sem justa causa.

Como objeto do julgamento estava a Convenção 158 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1982, que versa sobre o término da relação de trabalho por iniciativa do empregador, estabelecendo para os países signatários a regra de que “não se dará término à relação de trabalho de um trabalhador a menos que exista para isso uma causa justificada relacionada com sua capacidade ou seu comportamento ou baseada nas necessidades de funcionamento da empresa, estabelecimento ou serviço” (art. 4º).

Em outras palavras, a Convenção visa proteger o trabalhador de demissões arbitrárias, prevendo, inclusive, que, antes da rescisão contratual por iniciativa do empregador, deve ser dada ao trabalhador “a possibilidade de se defender das acusações feitas contra ele” (art. 7º).

No Brasil, houve a adesão formal desse tratado internacional após ratificação pelo Congresso Nacional em 1996. E daqui surge o imbróglio jurídico que durou quase 03 décadas, isto porque, meses depois de entrar em vigor no país, a Convenção 158 da OIT foi denunciada pelo então presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, por meio do Decreto 2.100/1996, sem a devida anuência do Congresso.

Em fevereiro de 1997, ou seja, apenas dois meses após a publicação desse decreto, entidades laborais como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) e a Central Única dos Trabalhadores (CUT) acionaram o STF sob o argumento de o decreto seria inconstitucional, pois o Congresso Nacional não teria aprovado a denúncia apresentada pelo Chefe do Executivo Federal.

De lá para cá se passaram 26 anos, num julgamento com inúmeras e longas interrupções, com sete pedidos de vista regimental, e votos de diversos Ministros que já sequer fazem parte da composição atual do Supremo.

Enfim, foi finalizado o julgamento da ADI 1625, tendo o STF, por maioria, julgado improcedente a ação, validando o Decreto 2.100/96, que tornou pública a denúncia, pelo Brasil, da Convenção da OIT nº 158.

Cumpre destacar, contudo, que os Ministros entenderam que a denúncia de tratados internacionais, pelo Presidente da República, exige necessariamente a sua aprovação pelo Congresso Nacional para gerar efeitos no ordenamento jurídico interno. Contudo, reconhecendo a existência de um “senso comum institucional” e visando garantir uma maior segurança jurídica às relações trabalhistas, os Ministros decidiram pela modulação dos efeitos dessa decisão, sem retroatividade do entendimento firmado.

Na prática, tal posicionamento, ao validar a denúncia da Convenção 158 da OIT, manteve inalterada as regras e procedimentos atuais, em que o empregador não está obrigado a justificar o motivo de uma demissão sem justa causa.

Sem dúvida, é uma decisão que tranquiliza os empreendedores, pois, se fosse outro o entendimento do STF, seria nebuloso o cenário futuro diante da insegurança jurídica que se instalaria nas relações trabalhistas, inclusive, com exponencial aumento de reclamações na Justiça do Trabalho.

Não há aqui defesa a demissões arbitrárias, que são repulsivas e que a legislação trabalhista, com amparo na Constituição Federal, já conta com instrumentos efetivos para combatê-las. O ponto aqui, de fato festejado, é que a decisão do Supremo proporciona segurança e previsibilidade, que devem ser pilares em qualquer relação e, em especial, na relação entre empregado e empregador, pela sua natureza econômica, política e, acima de tudo, social.