Pesquisa pontua as causas para o alto grau de litigiosidade na Justiça do Trabalho

Buscando explicações para o cenário de super-litigância no Brasil, um Estudo da FGV, denominado “O Judiciário Destrinchado pelo ‘Big Data’[1], tem elaborado relatórios com o objetivo de fomentar o debate entre a academia, a sociedade civil e a Administração Pública acerca dessa problemática, que acarreta na existência atualmente de mais de 100 milhões de processos tramitando na Justiça brasileira.

O primeiro relatório foi elaborado talvez no ápice da litigiosidade na esfera trabalhista, considerando que no ano de 2017 tramitaram 5,5 milhões de processos na Justiça do Trabalho, com um histórico assombroso de 20 milhões de novas ações nos 05 anos anteriores.

Nessa fase inicial do estudo, com base na análise de milhares de decisões judiciais, foi possível a constatação de que (i) em 88,5% dos casos, os empregados têm seus pedidos contemplados, total ou parcialmente; e que (ii) em mais de 99% dos casos, o benefício da Justiça Gratuita, quando requerido, foi concedido ao empregado reclamante.

A consequência da combinação desses dois fatores pode ser definida através de uma máxima muito conhecida para aqueles que militam na Justiça do Trabalho, de que “pedir mais nunca é demais”.

O segundo relatório da pesquisa, recentemente publicado, conclui que duas características essencialmente impulsionaram a super-litigância na Justiça do Trabalho: (i) o nível dos juros que corrigem o débito trabalhista; (ii) o baixo custo de litigar.

De forma resumida, a taxa de juros aplicada na Justiça do Trabalho seria convidativa para ambas as partes em litígio. Para os devedores, seria mais vantajoso quitar outras dívidas ou realizar investimentos, que teriam custos efetivos mais elevados, do que quitar as dívidas trabalhistas. Já na perspectiva dos credores, essa mesma taxa de juros conseguiria ser um excelente investimento, pois atingiria uma rentabilidade superior a boa parte das carteiras de investimento comercializadas no mercado.

Diante dos dados colhidos na pesquisa, o princípio da celeridade processual estaria sendo sufragado pelo interesse comum das partes na taxa de juros aplicada aos débitos trabalhistas, ainda que sob prismas diversos.

Quanto ao baixo custo de litigar, tal característica decorreria do fato da maior parcela do custeio da máquina judicial advir de subsídios estatais (na forma de impostos), o que se agrava na Justiça do Trabalho em virtude do histórico de custas judiciais ínfimas e de concessões desmedidas do benefício da Justiça Gratuita.

Um ponto interessante abordado pela pesquisa, ainda em relação ao baixo custo de litigar, é o de que o número gigantesco de cursos de direito no país também seria um fator determinante para o baixo custo de litigar. Nesse cenário de aumento exponencial de advogados no mercado, é inegável que há um impacto direto e substancial no patamar remuneratório da categoria, o que, lógica e inevitavelmente, acaba contribuindo para a redução do custo de acesso ao Judiciário e, consequentemente, para o aumento da litigiosidade no Brasil.

Em relação a esse tema, é necessário mencionar os efeitos que a famigerada Reforma Trabalhista (Lei nº 13.467/17) já está gerando. Após um ano de sua vigência, o Tribunal Superior do Trabalho noticiou que o principal impacto da Reforma foi justamente a redução do número de reclamações trabalhistas, uma queda de aproximadamente 35%.

Ao inovar prevendo a possibilidade de acordos extrajudiciais serem homologados judicialmente (art. 652, da CLT) e de rescisões ocorrerem mediante acordo entre empregado e empregador (art. 484-A, da CLT), a Lei nº 13.467/17 teve como objetivo o abrandamento da animosidade que sempre imperou nas relações de trabalho.

Por sua vez, dispositivos que preveem o pagamento de custas processuais e honorários advocatícios (art. 791-A, da CLT) à parte sucumbente, assim como o que regula a concessão da justiça gratuita (art. 790, §4º, da CLT) acarretaram numa majoração importante e necessária do custo para litigar na Justiça do Trabalho.

Criticada, e certamente longe da perfeição, a Reforma Trabalhista tem sim gerado efeitos práticos salutares, principalmente quanto a queda vertiginosa da litigiosidade, seja pelo abrandamento da animosidade entre empregado e empregador seja pelo aumento do custo/risco do processo.

Não há dúvida de que o caminho para um sistema judicial ideal no Brasil ainda é longo e tortuoso, mas, como bem pontuado pelos pesquisadores da FGV, “a dificuldade não deve ser óbice para se buscar pelo menos abrandar os problemas”.

{C}[1] https://direitosp.fgv.br/node/134740