Medida Provisória da Liberdade Econômica e seus impactos nas relações contratuais

Em 20 de setembro de 2019, foi sancionada a Lei 13.874, mantendo as alterações legais realizadas pela Medida Provisória nº 881, a “denominada MP da Liberdade Econômica”. Com isso, restaram consolidadas as modificações feitas a diversos textos legais, instituindo a Declaração de Direitos da Liberdade Econômica, além de trazer mudanças em regras trabalhistas e estabelecer normas gerais de livre mercado.

Dentre as matérias que circundam o universo das atividades empresariais, a nova lei manteve as alterações realizadas pela Medida Provisória no art. 50 do Código Civil, que trata da desconsideração da personalidade jurídica, trazendo conceitos e delimitando parâmetros para se apurar as hipóteses de seu cabimento.

Como se sabe a regra geral é a autonomia existente entre a pessoa jurídica e as pessoas físicas que a compõe, inclusive no âmbito patrimonial. O art. 49-A do Código Civil é expresso nesse sentido para que, primordialmente, se tenha em mente que a desconsideração da personalidade é uma excepcionalidade à regra de autonomia patrimonial.

Com a Aprovação da Medida Provisória, alguns conceitos foram esclarecidos no art. 50 do Código Civil. Neste caso, houve um direcionamento mais específico para aplicação do instituto da desconsideração da personalidade jurídica. A começar pelo caput do artigo que, ao aprimorar o texto de cabimento da desconsideração, determina que a sua aplicação atinja “bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso”.

Assim, a partir de agora, este instrumento de extensão da responsabilidade limita-se a atingir patrimônio daqueles que foram beneficiados pelo abuso, excluindo aquele sócio que não obteve qualquer vantagem em razão da má conduta de outrem.

Além disso, foram criados parágrafos ao texto normativo, definindo o que seria desvio de finalidade, confusão patrimonial, tornando estes conceitos mais claros para sua respectiva aplicabilidade, aumentando a segurança jurídica aos empresários, que compreenderão as hipóteses de cabimento e quais situações devem ser evitadas para coibir a aplicabilidade de instituto de responsabilização.

Nesse contexto, vale ressaltar que, ao conceituar o desvio de finalidade como característica para despersonalização, a lei que consolidou a Medida Provisória fez alteração no texto, excluindo a necessidade de se comprovar a atitude dolosa (intencional) para se caracterizar o desvio. Agora, basta utilizar a pessoa jurídica com o propósito de lesar credores ou para a prática de qualquer ato ilícito para se enquadrar como desvio de finalidade.

Também nessa nova redação, foi firmado o cabimento da chamada “desconsideração reversa”, na qual busca atingir o patrimônio da pessoa jurídica, por esvaziamento de forma fraudulenta, o patrimônio da pessoa física, trazendo à legislação conceito já aplicado pela Judiciário, com base nas regras do Novo Código de Processo Civil. Agora esta modalidade de desconsideração possui amparo legal também no Código Civil.

Ainda, o texto normativo deixa evidente que a existência de Grupo Econômico, por si só, não autoriza a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica. Algumas decisões judiciais entendiam que a existência de grupo econômico gerava presunção da confusão patrimonial entre empresas. A alteração normativa limita, mais uma vez, impede a aplicação extensiva do instituto da desconsideração.

Diante disso, é possível ver que estes novos parâmetros buscam trazer uma maior segurança jurídica aos empresários, uma vez que estas modificações visam estabelecer, de forma mais objetiva, as ocasiões em que se permite o afastamento da autonomia patrimonial das pessoas jurídicas, reforçando a excepcionalidade dessa forma de atuação. Consequentemente, reduz-se a discricionariedade do Judiciário na aplicação do instituto, em prol da liberdade econômica e da preservação da empresa.