Banco de horas negativo é validado pelo TST

*Por Luciano Coelho

A previsão de banco de horas negativo é muito comum em acordos coletivos e simplesmente consiste na possibilidade de o empregado, em virtude das necessidades e/ou diretrizes da empresa, trabalhar menos horas do que o seu horário regular por um determinado período, resultando em um saldo negativo em seu banco de horas.

Em regra, esse saldo negativo deve ser compensado posteriormente com a realização de horas extras (observados os limites legais), em número proporcional ao número de horas negativas até então existentes no banco.

Contudo, ao final do período de compensação ou em caso de rescisão contratual, o saldo existente no banco de horas precisa ser resolvido pelo empregador. Quando esse saldo é positivo, o pagamento das horas extras acumuladas deve ser feito, inclusive com os adicionais previstos.

O problema se instaura quando o saldo é negativo, pois normalmente os acordos coletivos preveem a possibilidade de desconto do valor correspondente, inclusive nas verbas rescisórias do trabalhador, que, não conformado, acaba muitas vezes judicializando a questão, buscando o ressarcimento do valor descontado perante a Justiça do Trabalho.

Em caso recentemente apreciado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST), o Ministério Público do Trabalho (MPT) ajuizou ação civil pública contra acordos coletivos firmados entre o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de Londrina e Região e a PZL Indústria Eletrônica Ltda., que disciplinavam que o período de apuração dos créditos e dos débitos do banco de horas seria de 12 meses. Na ação, o MPT, dentre as suas fundamentações, argumentou que não havia autorização legal para os descontos e que as cláusulas violariam direito indisponível e trariam prejuízos aos empregados, pois transferiam a eles os riscos da atividade econômica (Proc. RR-116-23.2015.5.09.0513).

É importante registrar que a jurisprudência anterior do TST era de que os possíveis prejuízos resultantes da falta de compensação das horas negativas ao longo da vigência do contrato de trabalho deveriam ser assumidos pelo empregador, pois a dispensa da prestação de serviços, no posicionamento da Corte Trabalhista, atenderia aos interesses do setor econômico, mesmo quando a pedido do próprio empregado.

Essa interpretação, entretanto, foi alterada em observância a tese vinculante de repercussão geral fixada pelo STF (Tema 1.046), de que apenas os direitos absolutamente indisponíveis garantidos pela Constituição Federal, tratados internacionais ou normas de saúde e segurança no trabalho não podem ser reduzidos por negociação coletiva.

O TST, sob essa nova ótica, entendeu que a implementação de banco de horas, com previsão de desconto salarial das horas negativas não compensadas, não envolve direito irrenunciável do trabalhador, considerando válida a convenção coletiva firmada entre o sindicato e a empresa.

Essa decisão garante uma maior segurança jurídica para as empresas que se utilizam do banco de horas negativo para lidar com as oscilações de demandas no seu nicho de mercado (otimização da produtividade), para uma gestão mais eficiente das horas extras dos seus colaboradores ou mesmo para que os seus funcionários possam ter flexibilidade em suas jornadas de trabalho.

No entanto, é importante que o sistema de banco de horas seja corretamente implementado, observando os aspectos legais necessários para sua validade, a exemplo de sua formalização, que deve necessariamente ocorrer por meio de norma coletiva (convenção ou acordo coletivo) ou acordo individual escrito (artigo 59, §§ 2º e 5º e artigo 611-A, II, da CLT), com regras proporcionais e transparentes, que não mitiguem direitos fundamentais dos trabalhadores.