Adequações na legislação para equilíbrio das relações de consumo em virtude dos impactos da pandemia – COVID-19

A disseminação da pandemia de COVID-19 trouxe uma grande mudança na rotina das pessoas por todo o mundo, ocasionado grandes alterações e impactos em vários setores importantes, dentre eles às relações de trabalho, mudanças sociais e, principalmente, nas relações de consumo, sendo cada vez mais evidentes os efeitos generalizados da pandemia em toda a cadeia de fornecimento e de consumo em diversos setores.

As medidas preventivas de restrição impostas pelo Poder Público, dentre elas a determinação de fechamento dos estabelecimentos comerciais, com a recomendação de isolamento social sem dúvida, deixaram  grandes incertezas, dúvidas de como agir, a quem procurar e o que se esperar, levando em consideração que o cumprimento de tais medidas enseja, necessariamente, na restrição no consumo de produtos, na execução de serviços, especialmente com a suspensão/interrupção nos contratos firmados entre consumidores e fornecedores.

Diante disso, cientes de estamos diante de uma situação excepcional, o Poder Público e as autoridades de consumo têm se posicionado sobre diversos setores da economia no intuito de amenizar os impactos das restrições, de forma a não ocasionar um grave desequilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Sem a intenção de exaurir a matéria, cabe trazer algumas dessas medidas que, neste momento, são extremamente importantes para restabelecer o equilíbrio das relações de consumo.

Uma das primeiras medidas implantadas foi a da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL) que, em 24 de março de 2020, de forma preventiva e protetiva, aprovou um conjunto de medidas para garantir a continuidade do serviço de distribuição de energia elétrica, protegendo consumidores e funcionários das concessionárias em meio ao cenário de pandemia. Suspender os prazos para a solicitação de ressarcimentos por danos em equipamentos, reduzir os desligamentos programados, mantendo somente aqueles estritamente necessários e suspender os cortes de fornecimento de energia elétrica para aqueles que não tivessem condições de realizar o pagamento das contas de luz, foram algumas das medidas aplicadas para manter este serviço essencial ativo, e estarão em vigor até o dia 31.07.2020.

Além disso, vale destacar a medida imposta pela lei 14.010/2020, que trata da suspensão, até 30/10/2020, do direito de arrependimento do consumidor nas compras fora do estabelecimento comercial, previsto no art. 49 do CDC para dois tipos de produtos essenciais: os bens perecíveis ou de consumo imediato, como os casos de pedidos de pratos de comida por “delivery” e os de medicamentos. Com o isolamento social, o fechamento do comércio e cumprimento da quarentena, o volume de compras online aumentou consideravelmente, especialmente no regime delivery, exigindo-se a adaptação da legislação diante desta mudança drástica na rotina dos brasileiros.

Outras providências que merecem destaque é a criação de medida emergencial para disciplinar o reembolso e a remarcação de passagens de voos cancelados durante a pandemia através da MP 925/2020, aprovada pelo Senado em 15.07.2020, e a fixação de regras para cancelamento e remarcação de reservas, eventos e serviços turísticos e culturais em razão da pandemia previstas na MP 948/2020, aprovada pelo Senado Federal em 30.07.2020, ambas aguardando sanção presidencial.

Na primeira, os passageiros que decidirem adiar as suas viagens marcadas entre 19 de março a 31 de dezembro deste ano, serão isentos de multas pela remarcação, tendo o prazo de 18 (dezoito) meses, a contar do voo frustrado, para utilizar o crédito na compra de uma nova passagem, arcando apenas com eventuais valores referentes a diferença das tarifas quando marcarem a nova data de viagem. Optando pelo cancelamento da compra, o fornecedor terá o prazo de 12 (doze) meses para restituir os valores, estando sujeito ao pagamento de eventuais penalidades contratuais.

No que concerne à MP 948/2020, “o texto coloca à disposição dos prestadores de serviços afetados pela pandemia várias opções para oferecerem aos clientes. Ingressos, reservas, passagens e outros tipos de compras poderão ser remarcados dentro de prazo específico ou convertidos em crédito com o prestador. Caso a opção seja por reembolso, o prestador poderá fazer acordo com o cliente para devolução dos valores ainda durante a pandemia. Caso contrário, terá até 12 meses depois do fim do estado de calamidade (previsto para 31 de dezembro) para fazer a restituição integral”.

Não resta dúvidas de que os danos e prejuízos advindos pela pandemia do covid-19, são inúmeros, especialmente dos contratos oriundos da relação de consumo. No entanto, os especialistas e autoridades do assunto ponderam que, neste momento, a postura ideal é agir de maneira colaborativa para manter o equilíbrio em tais relações, ao invés de se perseguir medidas judiciais para qualquer transtorno na esfera do consumidor. Realizar boas práticas de consumo, agir com prudência e paciência diante de um impasse contratual e realizar acordos, visando a divisão das vantagens e prejuízos, são medidas fundamentais para a continuidade das relações e restabelecimento do equilíbrio econômico da sociedade.